As abundantes colheitas e os numerosos rebanhos são um raro ponto
positivo na economia brasileira, que em 2015 apresentou sua maior contração nos
últimos 35 anos e deve encolher mais 3,7% em 2016.
A agricultura foi o único setor do Brasil que se expandiu no ano passado,
em 1,8%, ao passo que o produto interno bruto recuou 3,8%.
'O mundo todo tem que comer e o Brasil está se sustentando com a
agricultura', diz Edimilson Calegari, gerente-geral da Cooperativa dos
Cafeicultores de São Gabriel, a Cooabriel, no Espírito Santo. 'Nossas lavouras
e fazendas de gado são o que mantiveram a economia funcionando durante esses
três anos ruins.'
A forte desvalorização do real no ano passado - 30% em relação ao dólar -
deu impulso às exportações e mais do que compensou a queda nos preços das
commodities. Isso ajudou a aumentar as reservas em moeda estrangeira e a
reduzir o déficit em conta corrente do Brasil.
Normalmente, seria de se esperar que as previsões de safras volumosas
neste ano pudessem empurrar para baixo os preços das commodities, reduzindo os
ganhos dos produtores brasileiros.
Até agora, porém, os preços da soja, do açúcar e do café arábica estão
todos subindo neste ano devido a uma variedade de fatores, incluindo
preocupações com as condições meteorológicas em outros países produtores de
commodities.
O real se valorizou ante o dólar recentemente, acumulando uma alta em
torno de 10% desde 22 de janeiro. Mas, numa tentativa de ajudar os
exportadores, o Banco Central vem intervindo no mercado de câmbio, com a meta,
segundo analistas, de impedir que o dólar caia abaixo de R$ 3,60.
Isso é uma boa notícia para os agricultores, cujos produtos continuam
mais baratos que os de seus pares nos Estados Unidos e na Europa.
'O Brasil ficou muito mais competitivo no ano passado por causa do real
mais fraco, e isso realmente ajudou a aumentar as exportações' e os ganhos dos
produtores, diz Natália Orlovicin, analistas da INTL FCStone, firma americana
de serviços financeiros.
A agricultura oferece um exemplo raro de um setor globalmente competitivo
no Brasil. A manufatura do país, em grande parte ineficiente, ainda é altamente
protegida por tarifas e impostos de importação, mas o governo seguiu uma
estratégia diferente com a agricultura.
A partir dos anos 90, o Brasil reduziu subsídios agrícolas e eliminou
impostos de exportação, enquanto ampliava o investimento na pesquisa agrícola.
Os produtores responderam com uma rápida expansão da área cultivada e uma onda
de investimentos que os colocou entre os agricultores mais produtivos e mais
eficientes do mundo.
O poder de influência da agricultura na economia brasileira ficou em
destaque neste ano, quando a presidente Dilma Rousseff cogitou reintroduzir um
imposto sobre exportações agrícolas para ajudar a reduzir o enorme déficit no
orçamento do governo.
A influente Confederação Nacional da Agricultura (CNA) condenou
imediatamente a proposta. A ministra da Agricultura, Kátia Abreu, ela mesma uma
pecuarista e ex-presidente da confederação, também se opôs à iniciativa, que
parece ter sido discretamente descartada.
Há apenas alguns anos, quando os preços das commodities estavam altos e a
China comprava grandes quantidades de minério de ferro do Brasil, a commodity
era a campeã das exportações brasileiras. As vendas externas do minério
alcançaram o recorde de US$ 41,8 bilhões em 2011, mas despencaram para US$ 14,1
bilhões no ano passado.
Enquanto isso, o total das exportações de soja e produtos à base de soja
subiram de US$ 23,9 bilhões em 2011 para US$ 31,3 bilhões em 2014. Embora as
vendas tenham recuado para US$ 27,9 bilhões no ano passado, a soja ainda
superou o minério de ferro no valor das exportações.
'Os produtos de soja são a locomotiva' do setor agrícola do Brasil, diz
Endrigo Dalcin, presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato
Grosso, a Aprosoja-MT. 'Foi o que salvou nossa balança comercial no ano passado
e, neste ano, acho que vai chegar a um novo recorde de exportações.'
Porém, apesar da força da agricultura brasileira, ela enfrenta muitos
desafios. Entre eles estão estradas deficientes, falta de ferrovias e portos
sobrecarregados, o que prejudica o fluxo dos produtos até o mercado.
O custo de transportar a soja da região produtora do Cerrado para o porto
de Santos é perto do quádruplo do que os produtores do Estado americano de
Illinois, por exemplo, gastam para enviar sua soja para o porto de Nova
Orleans, segundo a Aprosoja-MT.
E, embora o real esteja estimulando as exportações, o governo não tem
feito o suficiente para ajudar o setor agrícola e o restante da economia, diz
Mario Lanznaster, um criador de porcos de 75 anos que vende 36 mil cabeças
anualmente em sua fazenda próxima a Chapecó, em Santa Catarina.
Lanznaster gostaria que o governo construísse uma ferrovia para ajudá-lo
a transportar do interior do país o milho que serve de ração para os porcos e
frango que cria. A ferrovia cortaria custos e tornaria ainda mais baratos os
animais que ele vende no Brasil e no exterior.
'Não há dúvida de que o real desvalorizado nos ajuda, nos torna mais
competitivos', diz ele. 'Mas os brasileiros também têm que comer. Precisamos
fazer a economia crescer de novo, criar mais empregos para que as pessoas aqui
possam comer mais e melhor.'
Fonte: The Wall Street Journal
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